Todo mundo tem uma história para contar sobre os avós dos nossos filhos. Sejam elas histórias estranhamente engraçadas, sejam elas histórias de discussão, briga e falta de validação de sentimentos. Mas a grande questão é que, em algum nível, temos que fazer com que essa relação seja positiva, no fim do dia.
É difícil? Muito. É um assunto difícil para mim, inclusive, e imagino que boa parte da dificuldade de lidar com os avós dos nossos filhos é porque eles são os nossos pais.
Eu tentei reunir aqui algumas coisas que me ajudam a ter empatia nessas situações, e gostaria de dividir isso com vocês.
A boa e velha empatia sempre ajuda
Nós estamos aqui, seguindo nossa jornada, buscando o que queremos para a nossa paternidade (ou maternidade). O caminho que escolhemos é normalmente o mais trabalhoso, porque exige de nós um olhar mais atento aos nossos filhos. Além disso, hoje, temos acesso a muito mais informação do que as gerações anteriores. Por isso, comparar essas paternidades e maternidades seria algo bastante injusto, além do fato de que comparações só servem para deprimir as pessoas.
Portanto, quando optamos, por exemplo, criar nossos filhos com alguns dos preceitos da criação com apego, isso pode ser bastante diferente do que os nossos pais nos ofereceram. E, para eles, observar os filhos deles criando os netos deles pode ser um enorme causador de culpa, como se houvesse sempre um letreiro dizendo que tudo o que eles fizeram conosco estava errado, muito errado.
Esse é um dos exercícios mais difíceis que eu tive que fazer, de tentar fazê-los entender que a minha jornada não é melhor ou pior que a deles. É apenas diferente. É a minha jornada. Mesmo que eu faça tudo diferente do que os meus pais fizeram — e nem é esse o caso — isso não significa que eu sou melhor do que eles, apenas significa que eu estou tentando outras coisas, tentando encontrar a minha paternidade, e tentando ser o melhor pai que eu posso ser.
Talvez os nossos pais nunca consigam entender isso, porque se existe um grande inimigo que todos nós temos em comum é a culpa.
Somos nós que criamos os nossos filhos, não os avós
Uma das coisas que me preocupava muito era como os avós podem influenciar negativamente os nossos filhos. Seja falando palavrões, ou oferecendo opções não saudáveis de comida, ou fazendo comentários gerais sobre vidas e pessoas que não condizem com o que eu quero passar para os meus filhos.
Tudo isso era motivo de muita aflição para mim, até o dia que eu ouvi dizerem que não são os avós que criam os nossos filhos, somos nós. Foi essa frase que me fez cair em mim novamente e entender que a responsabilidade é nossa.
Claro, existem os casos em que precisamos dos avós para cuidar dos nossos filhos enquanto trabalhamos, mas tirando esses casos, que podem ser amenizados com muita conversa empática, não são os avós que criam os nossos filhos. Somos nós.
E o que isso quer dizer? Que não temos que educar os nossos pais para fazer o que desejamos que os nossos filhos façam. Precisamos, sim, educar os nossos filhos, e esse deve ser o foco.
Um exemplo prático disso foi um dia, numa pracinha, os meninos estavam brincando com estalinhos. Assim que acabaram os estalinhos, meu pai falou para o Dante jogar a caixa no chão. Eu poderia ter dado um sermão no meu pai, que obviamente não acabaria bem, mas como eu tenho que educar o meu filho, abaixei para ele e falei:
— Filho, nós não jogamos lixo no chão. Pega a caixinha e vamos ali jogar no lixo.
Por mais que a reação dos nossos pais não seja tão positiva quando isso acontece, pelo menos estamos focando nas nossas responsabilidades: educar os nossos filhos.
Escolha as suas batalhas
Isso é um lema que eu levo para a vida, mas que funciona particularmente bem com os avós. Pode ser que, na minha, casa, no dia-a-dia, meus filhos não vejam TV, que comam apenas coisas saudáveis, que brinquem apenas com brincadeiras lúdicas e educativas. E tudo bem. Na nossa casa, funciona como a gente gostaria que funcionasse, né?
Mas na casa dos avós provavelmente é diferente, até porque as pessoas são diferentes. E eu poderia chegar todas as vezes nas casas dos avós com um monte de dados, evidências científicas e textos embasados para mostrá-los o meu ponto. Provavelmente não seria uma conversa amena, e certamente não sairia do jeito que eu gostaria.
Temos a oportunidade de escolher as coisas que são realmente importantes e inflexíveis para nós, como dar refrigerante aos meus filhos. Por mais que eles não consigam entender bem essa decisão minha, afinal, para eles, eu tomo refrigerante desde criança e, para eles, estou super bem, essa é uma decisão da qual eu não abro mão.
Por outro lado, eu não posso entrar na casa deles e pedir que eles desliguem as TVs, porque na minha casa a TV não fica ligada 24 horas por dia, e porque eu não quero que os meus filhos assistam TV desse jeito. Bem, eu até posso pedir isso, mas seria mais uma demanda minha que estaria sujeita a discussões acaloradas. E, como os meus filhos não vivem todos os dias na casa dos avós, tudo bem a TV estar ligada nesses momentos.
Então, entre ceder e empatizar, eu tento me equilibrar naquilo que é mais importante para mim: uma relação bacana dos meus filhos com os meus pais.
Eu queria também indicar a vocês uma série bem legal, chamada “A Grande Viagem”, que conta a história de um avô com Alzheimer e seu neto. O avô começa a misturar passado com presente e as perdas de memórias fazem com que ele comece a reviver alguns momentos da sua juventude, enquanto vendedor de guias de viagens.
Então, quando o neto começa a embarcar nessas fantasias, eles passam a viajar pelo mundo, indo a um país diferente a cada episódio, numa busca linda pela memória do avô, sempre dando asas a imaginação, de forma lúdica e divertida.
É uma série muito sensível que fala bem sobre memória e perda, mas também é bem divertida e dá para assistir junto com as crias, então recomendo bastante a vocês!
“A Grande Viagem” será exibida na TV Brasil, todas as sextas, às 20:30, de 20 de janeiro até 14 de abril. As reprises são aos domingos, às 11:00.
Você também pode acompanhar a série pelo Facebook, vai lá e da uma curtida! O link é esse aqui: “A Grande Viagem”.
9 comentários em “Uma Carta de Empatia para Avós”
Que belo texto! Passei por este dilema em relação aos meus sogros e a criação de meu filho. Não foi fácil, mas vejo este pensamento como o mais saudável para todos os envolvidos. Parabéns por ter exposto isto de uma forma tão simples e didática.
Obrigado pelo comentário!
Vou ser bem franca: se eu tivesse um filho, ia deixar o menos possível perto de meus pais. Eu não tive uma educação equivocada, isso seria eufemismo; eu tive uma existência recheada de violência, traumas e abusos intensos, que até hoje me custam terapia, crises de depressão e ansiedade, além de fracassos atrás de fracassos em tudo o que tentei fazer da vida. Tenho mais de 30 anos e vivo como dependente ainda (não mais deles, graças a Deus). Minha irmã deixou seus 2 filhos nas mãos deles para serem criados e eu tenho pena do garoto mais velho, hoje já adulto. Nunca vi rapaz mais infeliz, revoltado e autodestrutivo (claro que, além da mãe ser negligente, o pai biológico dele também é um lixo humano). A garota, adolescente, é mais tranquila, mas também sofre de alguns transtornos depressivos.
Para resumir, meu pai é uma pessoa impossível de se ficar perto. Eu podia despejar o monte de palavras dolorosas que me vêm à mente quando penso no exercício de paciência e sacrifício que é estar na presença dele, mas prefiro me preservar, porque eu mereço. Hoje só evito maiores convivências e sou meramente educada quando nos falamos.
Na atualidade me dou melhor com minha mãe, mas por tudo o que passei, e por não ter tido a defesa dela quando mais precisei, não sei se confiaria em deixar meu filho sozinho com ela, mesmo que só por algumas horas.
A respeito dos meus sogros, a coisa muda muito de figura. Mas quanto aos meus pais, definitivamente eu não permitiria que uma criança minha ficasse próxima de tanto preconceito, desrespeito, hipocrisia, desproteção e comportamento inadequado e violento. Não é nem questão de empatia pelos avós ou a falta dela, mas de bom senso.
Oi, Latifa.
Puxa, quanta dor e raiva eu consigo ler no seu comentário. Lamento muito que a vida tenha sido assim para você e espero, de coração, que você consiga encontrar um pouco mais de paz através da terapia.
Um abraço apertado!
Eu também. Muito obrigada pelo apoio, e desculpe se soei raivosa demais. É difícil, mas estou pelo menos na intenção de me curar aos pouquinhos.
Grande abraço!
Por favor, não se desculpe! Você está em processo de cura, e essa reação é super normal. Veja como um avanço, pois você conseguiu escrever sobre isso, em um local público. É importante!
Um abraço!
Eu moro a 2000 km de distância dos meus pais, portanto a presença deles na vida do meu filho é algo precioso para nós. Precisei da minha mãe ano passado, quando tive pneumonia e fiquei 3 meses em tratamento. Ela ficou aqui conosco, cuidando do meu filho principalmente. E ela faz tudo diferente. Quando digo tudo, acredite. Concordamos apenas no quesito qualidade da alimentação, ela é tão rigorosa quanto eu quando se trata de comida saudável. Posso te assegurar que não há danos na educação. A criança sabe exatamente com quem está lidando muito cedo. O caos na hora do banho com ela não acontece comigo. As refeições catastróficas, de sujar parede e teto com ela não acontecem comigo. Na hora de dormir, passeios na garagem e sacudidas no colo que acontece com ela, não acontece comigo. E essa é a delícia da vida! Ele vai lembrar dos momentos com ela com a leveza que nós, pais, nem sempre podemos dar ao luxo porque temos compromisso com a entrega de um ser humano educado para o mundo. Deixem os avós serem avós e sejamos nós os pais que eles pelrecisam.
Thiago, muito obrigada por esse texto. Acredito que esse tem sido um dos maiores desafios da maternidade: trabalhar a empatia nesse “conflito de gerações”, principalmente pq Elis fica com minha mãe enquanto eu trabalho então a influência é grande na educação dela e as concessões tem que ser estudadas e as batalhas escolhidas as vezes demoram a serem respeitadas. Minha alegria fica ao ver a mudança que essa relação está trazendo na minha relação com meus pais e neles próprios. A Elis está ensinando todos nós. E vamo que vamo!
<3