Como deixar seu filho comportado? A resposta é simples e direta: não há uma solução para fazer seu filho ficar comportado. Simples assim.
O título que eu escolhi para este post foi uma pequena estratégia minha para atrair as pessoas que desejam ter um filho comportado. Se você já lê o meu blog com frequência, não se preocupe que eu (ainda) não surtei! Mas se você chegou ao texto tentando descobrir a fórmula milagrosa para ter um filho comportado, por favor, fique, não vá embora! Não vai ter bolo, mas o texto pode ajudar você a enxergar as coisas de uma maneira diferente. Vamos começar com uma pergunta que você pode se fazer:
O que é um filho comportado?
Essa pergunta é muito pessoal e difícil de responder, ao mesmo tempo. O que você pode entender por filho comportado certamente não é o que outros pais e mães entendem por filho comportado. E sendo algo tão subjetivo assim, já dá para perceber que nenhum método que se diz “a solução para filhos comportados” deve ser um método bom. Trocando em miúdos, se algum especialista diz ter a fórmula secreta para criar filhos comportados, pode apostar que é balela.
O que define um comportamento bom ou um comportamento ruim? Pensando em como isso varia de família para família, fica fácil perceber que a definição de comportamento depende mais dos valores que cada pai e mãe têm para si do que o que um bebê (ou criança) deve fazer de fato. Então talvez, para você, ter um filho comportado passe por alguns destes desejos:
– Eu quero que o meu filho me obedeça.
– Eu quero que ele faça o que eu mando.
– Eu quero que ele arrume o quarto.
Antes de mais nada, acho importante refletir sobre o “mau comportamento”. “Mau comportamento” não é uma expressão de mau caratismo do seu filho. “Mau comportamento” não significa que seu filho é uma criança sem controle. “Mau comportamento” não quer dizer que seu filho não tem respeito por você. “Mau comportamento” não indica que o seu filho é “mau”.
Na verdade, o que acontece é que uma atitude do seu filho é encarada como “mau comportamento” sempre quando ele não age da maneira que você espera. Essa diferença de interpretação é muito sutil, mas essencial dentro da relação entre pais e filhos.
O que acontece, então? A verdade é que seu filho não agiu da maneira que você esperava. Pensando dessa maneira, nós, pais, assumimos a responsabilidade pelo que nós esperamos que os nossos filhos façam, ao contrário de lançar sobre eles a responsabilidade de serem intrinsecamente ruins, de acordo com um “código de conduta” que é extremamente variável, indefinido e desconhecido.
Quando passamos a pensar dessa maneira, nós criamos a possibilidade de refletirmos sobre a real importância daquilo que estamos cobrando dos nossos filhos, de quanto aquilo é uma simples demanda nossa, ou quão carregado de valores éticos pessoais aquilo está. Podemos, então voltar e refletir sobre os desejos que eu citei no início deste post.
Eu quero que o meu filho me obedeça
Obedecer é uma palavra que, por ser muito utilizada em nosso cotidiano, acabou sendo banalizada e muitas pessoas não sabem o real peso dela. O dicionário Michaelis define a palavra “obedecer” como submeter-se à vontade, não resistir, ceder.
É isso mesmo que queremos para os nossos filhos? Que eles submetam-se às nossas vontades, que eles não resistam, que eles cedam? Essa é a definição perfeita da disciplina tradicional autoritária que vemos por aí e que, para muitos de nós, foi o modelo que nossos pais utilizaram para nos criar. Não é isso que eu quero para o meu filho e espero que você também, de coração.
Mas isso também não significa que eu espere que meu filho vá correr pelas ruas, pelado, gritando, selvagem. Eu espero que, através da relação de apego seguro que eu estou criando com ele, meu filho entenda através de mim quais são os valores importantes a serem seguidos. Eu acredito, pela relação que nós temos, que ele tenha vontade de se espelhar no meu modelo de ser humano, que ele sinta uma vontade verdadeira e intrínseca de fazer o bem e ser feliz. Eu espero que meu filho queira ser assim porque ele sabe que, através do nosso vínculo, tudo o que ele sempre receberá de seus pais é amor incondicional.
Só que isso nos traz de volta a uma questão muito importante: o modelo. Se os nossos filhos olham para nós como modelos para os valores éticos que nós consideramos importantes para a formação deles, então esses mesmos valores devem ser parte das nossas vidas. Pois é, aquela história do faça o que eu digo, não faça o que eu faço não cola mais. Baita responsabilidade, né?
Eu quero que ele faça o que eu mando
Este é muito semelhante ao item anterior, só que bem mais explícito. Mandar remete ao poder. Só que o real poder na criação dos filhos está na nossa capacidade de fazer com que nossos filhos desejem ser bons, que eles desejem ser felizes e nos fazer felizes. Quando o vínculo entre pais e filhos se perde, o poder real se extingue e sobra apenas o poder da força.
Porém, esse é um poder vazio que, apesar de trazer resultados imediatos, nunca funcionará a longo prazo. O poder pela força não faz com que o seu filho tome decisões baseadas na própria vontade de fazer o bem, de fazer a si próprio feliz. Ao contrário, o poder pela força faz com que ele aja através da coerção, do medo, da vergonha, e de tantos outros sentimentos tão ruins para o seu desenvolvimento como ser humano.
Para piorar, nós acabamos ensinando aos nossos filhos que a maneira de se obter o que se quer é através da coerção, do medo e da vergonha.
Eu quero que ele arrume o quarto
Essa é uma questão difícil de rebater, não? É claro que eu não quero que o quarto do meu filho seja um caos de brinquedos e coisas espalhadas por todos os lados. Ninguém deseja isso, mas precisamos, novamente, refletir sobre a responsabilidade dos pedidos e ações.
Antes de continuar, eu preciso fazer um pequeno parêntese. Existe uma linguagem chamada Comunicação Não Violenta (do inglês, Nonviolent Communication) proposta por Marshall Rosenberg, um psicólogo americano, que é muito mais do que um método de linguagem, pois faz com que você veja o mundo com outros olhos. Não é o assunto principal deste post falar sobre CNV (Comunicação Não Violenta), e eu prometo escrever em detalhes sobre isso no futuro, mas é importante apenas dizer que precisamos ter muita atenção na maneira com a qual nos comunicamos. No caso, a maneira com que nos comunicamos com os nossos filhos.
De uma maneira geral, quando nós ouvimos uma demanda direta de alguém, a tendência é assumir uma postura reativa e, muitas vezes, contrária ao que nos foi demandado. Quantas vezes você já não pensou: “quem ele pensa que é, mandando eu fazer isso?” justamente pela maneira com que a comunicação foi estabelecida? Com crianças, então, essa reação é ainda mais forte. Faz parte do desenvolvimento dela assumir uma posição reativa nesses casos.
Voltando ao assunto da arrumação do quarto, vamos analisar uma demanda típica de um pai (ou mãe) autoritário:
– Júnior, vá arrumar o seu quarto.
Alguns pais acham que colocar um “por favor” no final faz diferença. Então, vamos colocar aqui também.
– Júnior, vá arrumar o seu quarto, por favor.
Independente do complemento “por favor”, isso ainda é uma demanda. Ainda é uma ordem. Você ainda não deu justificativas e nem opções. Por mais que você pense que as justificativas estão implícitas, afinal, é óbvio que todo mundo quer um quarto arrumado, é necessário deixar tudo bem explícito. Uma relação de respeito exige isso.
Se utilizarmos um pouco do que a CNV propõe, podemos transformar a demanda em pedido:
– Júnior, seu quarto tem brinquedos e roupas espalhados. Eu me sinto incomodado com isso, porque preciso ter uma sensação de organização na casa. Você poderia, por favor, arrumar seu quarto?
Como eu disse lá no começo do post, não há fórmula mágica para nada nessa vida, quanto mais para criar filhos. Mas não podemos negar que, quando você se dá o trabalho de colocar as coisas como o exemplo acima, demonstrando respeito pelo seu filho, as chances de que ele atenda o seu pedido tendem a aumentar, não é mesmo?
E agora, eu pergunto novamente: o que é um filho comportado?
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