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Criação com Apego, Birra, Manha e Afins

"Eu não gosto das palavras birra, manha e coisas do gênero. Quando você cria com apego, você é incentivado a ter um olhar empático sobre o seu bebê, tentando identificar qual necessidade que o bebê está tentando comunicar por trás daquele comportamento considerado indesejado pelos pais."

A cada dia que passa, mais e mais pessoas se interessam pela Criação com Apego. Isso, por si só, é motivo de grande alegria para todos nós, pais e mães apegadas que nos esforçamos para divulgar os benefícios de criar nossos filhos de maneira respeitosa. Mas ao mesmo tempo, é necessário que junto com o interesse, venha a disposição para se informar. Criar com apego significa confiar nos instintos mais profundos, aqueles que por muitas vezes estão adormecidos, mas também significa dedicação e estudo.

A Criação com Apego não é a solução de todos os problemas e se você chegou até aqui para resolver um problema (de comportamento, ou para fazer o bebê dormir a noite inteira, por exemplo), talvez você tenha vindo pelo motivo equivocado. Mas, calma! Não vá embora! Vai ter bolo! Já que você está aqui, posso mostrar a você uma maneira diferente de enxergar o que acontece com você e com o seu bebê.

Eu não divulgo a Criação com Apego como uma criação utilitária, que comprovadamente trará resultados, que fará sua vida ficar melhor, que lhe dará filhos obedientes, quietos, bonzinhos, independentes e que durmam a noite inteira e nunca choram. Na verdade, algumas dessas características que muitos pais e mães buscam são até questionáveis, em alguma extensão, no sentido de serem realmente características desejáveis para se desenvolver num bebê e no adulto que esperamos que ele se torne. Eu já falei um pouco sobre isso em Por Que Não Quero Que Meu Filho Seja Comportado, depois dá uma olhadinha lá.

Entendendo as Etapas de Desenvolvimento do Bebê

Quando eu disse lá em cima que criar com apego significa também dedicação e estudo, eu quis dizer que é muito importante para os pais conhecerem os principais saltos de desenvolvimento e crescimento dos bebês, para entender melhor o que eles podem estar passando e sentindo. Ter consciência das fases que os nossos bebês estão passando nos ajuda a responder melhor às suas necessidades, e ter a paciência necessária para entender que aquilo, como tudo na vida, vai passar.

Quando os bebês estão passando por um salto, muita coisa é influenciada: o humor, a rotina e o comportamento mudam. Eles tendem a ficar mais demandantes e irritadiços, e isso é perfeitamente normal. Felizmente, existe muitas fontes de informação sobre saltos de desenvolvimento e crescimento, como essa aqui, por exemplo.

Em resumo, se você percebeu uma alteração no comportamento do seu bebê, cheque para saber se ele não está passando por um salto. Se estiver, a solução é paciência redobrada e apego reforçado!

Colocando-se no Lugar do Bebê

Este é um exercício que ajuda muito nos momentos em que você pode começar a questionar a criação que pratica, e sucumbir aos (maus) pitacos que outras pessoas adoram despejar sobre você. Tente se colocar no lugar do seu bebê, tente imaginar como você se sentiria se estivesse passando pelo que o seu bebê está passando. Isso costuma me ajudar muito.

Vou citar alguns exemplos de situações que podem acontecer rotineiramente e que nós, pais e mães, podemos muitas vezes cair na tentação de culparmos nossos bebês por um comportamento que eles apresentam, ao invés de olhá-los com compaixão e empatia, buscando descobrir a necessidade por trás disso que precisa ser atendida.

Cercadinho

Algumas mães podem reclamar que seus filhos não ficam nem um segundo sequer no cercadinho (ou no berço) sem que eles façam um escândalo. Agora, imagine você, tendo que ficar presa em um lugar pequeno, chato, vendo todo o resto da casa para explorar e brincar, longe de quem você ama. Você curtiria? Eu faria o maior escândalo mesmo.

Bebês não gostam de ficar confinados, ainda mais os que já adquiriram algum degrau de locomoção, ou seja, os que já se arrastam, engatinham ou andam. Além disso, eles precisam da proximidade dos pais, de colo, peito, carinho, e segurança.

O ideal é deixá-los livres para explorar o ambiente, com as condições adequadas de segurança, mas livres também para ter um colo sempre que precisarem.

Lidando com o “não”

Muito se reclama de bebês que fazem um espetáculo pirotécnico quando os pais falam “não” para eles. Com o meu filho, não é diferente. Tente tirar algo da mão dele ou impedir que ele faça alguma coisa, que ele vai reclamar, reclamar, e reclamar mais um bocado.

Nesses momentos, eu costumo me colocar no lugar dele também, e imagino como deve ser péssimo você querer fazer alguma coisa e alguém simplesmente chegar e impedir você de fazer isso, mesmo que aquilo seja algo que ameace a sua segurança. Ué, se eu mal sei andar, como é que eu vou entender que não posso fazer uma coisa ou outra?

Bebês não entendem, nem têm maturidade emocional para lidar com a frustração. Além disso, só lá pelos 2-3 anos que a parte do cérebro que controla o impulso é desenvolvida, ficando completamente desenvolvida por volta dos 4 anos. Então é muito normal que um bebê aja desta maneira.

Mas o que funciona? Os pais estão destinados a surtarem? Não, existem algumas coisas que podem ajudar:

  • evite o “não” pelo “não”. Ouvir um “não” assim, puro, sem mais nem menos não ajuda em nada, não explica e não ameniza a frustração do bebê;
  • torne a casa segura para o bebê. Proteja tomadas, quinas, guarde o que pode quebrar e você não precisará ficar correndo atrás do seu bebê para protegê-lo;
  • distração e alternativa. Quando o seu bebê está brincando com algo que não deveria, converse com ele (mesmo que ele não entenda nada) e ofereça uma alternativa, que pode ser outro brinquedo ou atividade;
  • escolha as suas batalhas. Sempre que o bebê estiver fazendo algo que você não quer deixar, se pergunte: “será que ele realmente não pode mexer nisso, ou sou só eu que não quero?”. Às vezes, é melhor para o bebê e para a mãe que você deixe ele satisfazer uma curiosidade, se isso não envolver riscos à segurança dele.

Este é um assunto muito rico, e existem muitas maneiras de amenizar o impacto do “não” através da disciplina positiva, mas não é o foco deste post. Prometo escrever mais sobre isso no futuro!

A temida troca de fralda

Com o passar dos meses, os bebês tendem a se rebelar quando vão trocar fraldas. Rebelar, talvez, seja uma palavra até muito amena para descrever o comportamento dos bebês, porque há um momento que eles começam a odiar trocar fraldas com todas as forças. Eu consigo imaginar duas maneiras de trocar fraldas: a primeira é na base da grosseria, agarrando o bebê e praticamente trocando a fralda à força. Não preciso dizer o quanto isso é ruim e estressante não só para o bebê, como para os pais, né?

A segunda maneira é se colocar no lugar. Imagine você, sentado, todo feliz, brincando ou explorando a casa. Daí, alguém chega, interrompe o que você está fazendo, coloca você deitado numa posição que você odeia e se sente completamente vulnerável, levanta as suas pernas e começa a trocar as suas fraldas. Oi? Como assim? Quando eu for bem velhinho e alguém for trocar minhas fraldas geriátricas dessa maneira, pode apostar que eu vou fazer um escândalo.

Então qual é a segunda maneira de trocar fraldas? É a maneira gentil. Normalmente, quando eu vou trocar a fralda do Dante, é assim que eu faço:

  1. eu o pego no colo já falando o mantra “vamos trocar a fralda (ou xixi ou cocô)?”;
  2. vou com ele calmamente até o trocador, repetindo o mantra;
  3. quando chego em frente ao trocador, começo a apontar e encostar no trocador, e também a encostar e tocar na fralda dele, repetindo o mantra;
  4. então, eu deito ele para efetivamente trocar as fraldas, e isso funciona na maioria das vezes;
  5. quando não funciona, eu o pego no colo e repito o processo, tentando entender por que ele não está querendo trocar (pode ser sono, fome, etc.)

Birra, Manha e Afins

Agora que você já sabe um pouco sobre como as fases de desenvolvimento do bebê podem afetar o comportamento dele, e também viu que se colocar no lugar do bebê pode ajudar, vamos falar um pouco sobre birra, manha e coisas do gênero.

Bem, eu não gosto das palavras birra e manha. De verdade.

O uso dessas palavras quase sempre afeta a nossa capacidade de enxergar com clareza a realidade. Simplesmente falar que o meu bebê de 10 meses está fazendo birra, ou que o meu filho com 1 ano e 2 meses está fazendo manha, é assumir uma visão muito superficial e comodista da realidade. Quando eu falo que meu filho está fazendo birra ou manha, estou colocando nele toda a responsabilidade sobre o que eu estou sentindo no momento, e isso pode ser frustração, cansaço, etc.

O que acontece, na realidade, é que o bebê pode apresentar um comportamento que não esteja de acordo com a expectativa dos pais. E esse comportamento revela uma necessidade do bebê que não foi atendida, mas que ele não tem capacidade de comunicar claramente. Na maioria das vezes, o bebê sequer entende qual é a necessidade dele, e precisamos ajudá-lo nesse aspecto.

Bebês não têm maturidade cerebral para saber o que é birra, manha ou para serem manipuladores cruéis. Eles possuem necessidades que precisam ser atendidas e as comunicam da melhor maneira, dentro das possibilidades de cada bebê. Se pensarmos em termos de necessidades e atendermos de forma consistente e amorosa, estaremos ajudando nossos bebês a fortalecer os vínculos saudáveis e duradouros que estamos criando com os nossos bebês.

Thiago Queiroz

Thiago Queiroz

Psicanalista, pai de quatro filhos, escritor, palestrante, educador parental, host dos podcasts Tricô e Pausa pra Sentir (dentre outros), autor dos livros "Queridos Adultos", "Abrace seu Filho", "A Armadura de Bertô" e "Cartinhas para meu pai", participou também do documentário internacional "Dads".

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Comentários

51 comentários em “Criação com Apego, Birra, Manha e Afins”

  1. Thiago, eu adoro seus posts!

    Cai aqui por acaso, quando meu pequeno estava com dois meses, e, desde então, virei leitora assídua. Na madrugada, entre uma mamada e outra, li muita coisa que você escreveu e já perdi a conta de quantas vezes comecei (e não terminei) a escrever um comentário. Dessa vez, porém, não passa!

    Mesmo sem lhe conhecer, quero deixar registrado aqui meu agradecimento, porque foi através do seu blog que conheci a criação com apego. Mais do que isso, foi lendo o que você escreve que descobri que o que eu andava aprontando com meu pimpolho era, sim, muito bacana, e que eu não estava sozinha no meio da multidão com minhas ideias "diferentes".

    Apesar de mãe de primeira viagem, a boa e velha intuição me dizia que não era certo deixar chorar "pra aprender a não fazer manha", negar colo "pra não acostumar mal", limitar as mamadas de 3 em 3 horas "pra não virar escrava do peito", ou levar logo o bebê pra rua "pra ele não estranhar as outras pessoas".

    Certo, pra mim, era tentar me colocar no lugar do bebê pra poder compreendê-lo e, dessa forma, conseguir atender suas necessidades, fossem elas de peito, colo, carinho ou conversa.

    Resultado? Arthur está com 4 meses e meio, é um bebê super saudável, tranquilo e risonho.

    Apesar de, muitas vezes, ter dormido no colo, no peito e na cama, hoje ele dorme no berço e (creia!), pega no sono sozinho, abraçado com um paninho ou analisando os dedinhos da mão. Apesar de ter sido absurdamente abraçado, beijado e (por que não?) mimado, hoje ele é capaz de se entreter por mais de uma hora com o móbile ou o lustre do quarto, numa "independência" que até me assusta. Apesar de sempre ter mamado (e de ainda mamar) em livre demanda, hoje eu posso dar uma volta no shopping tranquila ou bater um bolo sem ficar com receio de ser chamada às pressas. E apesar de ter sido "preservado" de ambientes e pessoas estranhas durante os três primeiros meses (porque, até então, o que ele precisava mesmo era do silêncio, do escurinho e do peito), hoje ele é um bebê que adora lugares diferentes e que vai no colo de qualquer um na maior tranquilidade do mundo.

    Tem gente que diz que ele é assim porque eu era assim, ou porque o pai dele era assim, ou porque é o temperamento/gênio dele mesmo. Ok, é verdade. Mas é só meia-verdade. Há bebês que nasceram calminhos e se transformaram em mini tazmanias, e bebês que vieram ao mundo irritadíssimos e com o tempo mais parecem pequenos Budas. Muito do que meu filhote é hoje nasceu com ele, tudo bem, mas, por outro lado, muito também é fruto do esforço que eu e o pai fizemos pra que ele fosse respeitado como uma "pessoa grande".

    Então, viva a criação com apego!

    P.S. O mantra do "vamos trocar a fraldinha?" rola aqui desde os primeiros dias. Acho incrível como, depois de um tempo, ele conseguiu entender que não vai ser abandonado no trocador ou que a troca não vai durar pra sempre… 🙂

  2. Todo o MUNDO deveria ler esse texto. As pessoas tem ainda aquele pensamento arcaico de acharem que as crianças pensam para das as birras e manhas…É tão difícil, pq são poucas pessoas que leem e entendem.

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