Não sei quanto a vocês, mas vez ou outra, eu sinto que algumas pessoas estão muito preocupadas com o quanto elas podem praticar em termos de criação com apego, ao invés do que é realmente a relação que existe entre elas e seus bebês. É como se essa pergunta ficasse eternamente no ar:
– Quão apegado você é?
Se eu fizesse essa pergunta, pode ser que algumas dessas respostas surjam:
– Bastante!
– Sou muito apegada!
– Hmm, um pouco? Mais ou menos?
– Não sei se sou tão apegada, porque não faço tudo com apego.
– Nada, não crio meu filho seguindo regras.
Apesar de algumas respostas que eu citei aqui sejam bem diferentes umas das outras, todas elas têm um ponto em comum: uma visão equivocada sobre a criação com apego, como um todo. Para ilustrar melhor isso, eu vou criar alguns cenários aqui que você certamente já ouviu ou já até pensou.
– Eu precisei desmamar meu bebê aos 8 meses, por motivos pessoais.
– Não tive a oportunidade de ter um parto natural, e depois descobri que caí no conto da cesárea desnecessária.
– Eu precisei voltar ao trabalho e deixar minha bebê de 6 meses na creche.
– Eu uso o sling sempre e estou sempre dando muito chamego para o meu bebê, mas não faço cama compartilhada porque isso não é para mim.
Imagine a carga gigante de frustração e culpa que uma mãe (ou um pai) pode carregar em seus ombros por estar fazendo algo que, talvez, ela não gostaria de estar fazendo e, para piorar, pensa que não cria com tanto apego por causa disso. O simples fato de, por exemplo, ter que voltar ao trabalho quando a mãe deseja ficar com o bebê já massacrante o suficiente para a mãe. Ela precisa de acolhimento, e não achar que a criação que ela está dando é “menos apegada”.
Hoje em dia, é como se você obrigatoriamente precisasse ser “menos mãe” ou “menos mulher”. Eu gostaria de até sugerir uma variação: “menos apegada”. Ou seja, não tem escolha: você precisa ser “menos” alguma coisa. Não dá pra ser só mãe, ou só pai. A boa notícia é que esse conceito de “menos apegado” existe apenas pelo entendimento equivocado da criação com apego.
Como eu já disse aqui, criação com apego não é um checklist. Além disso, não existe um “apegômetro” que vai medir quão bacana você é na criação com apego. Não existem campeonatos de apego, troféus, medalhas, broches, nem estrelinhas. Só existe mesmo você e seu bebê. E o vínculo que será criado entre vocês.
Se você pensar que tudo tem a finalidade de criar um vínculo de apego seguro com o seu filho, numa relação onde o seu bebê possa se sentir emocional e fisicamente seguro e amado, pouco importa o que você fez ou deixou de fazer. É importante pensar no contexto, como um todo. É importante pensar no vínculo e como vocês vão conseguir criá-lo e fortalecê-lo ao longo dos dias, semanas, meses e anos.
Se você tirar tudo sobre os discursos que existem ao redor da criação com apego, o que sobra? Conexão. A conexão, o vínculo que une mãe e bebê, ou pai e bebê, é algo que irá incentivar fatores muito importantes na vida de qualquer família, como sensibilidade, entendimento, confiança. Em resumo, o amor incondicional que é essencial para qualquer relacionamento seguro e saudável.
O psicólogo Gordon Neufeld entrevistou várias pessoas para o seu livro Hold On to Your Kids, que fala sobre as relações e as dinâmicas dos vínculos. Dentre as pessoas entrevistadas, uma mãe disse algo que me marcou por ser tão simples e forte, ao mesmo tempo.
– Se você não entende o seu filho, você não pode aguentar o seu filho (If you don’t understand your kid, you can’t stand your kid).
Entendimento é conexão. Você não consegue entender alguém, nem mesmo o seu filho, se você não tem nenhuma conexão emocional com ela. E sem entender o seu filho, como você poderá demonstrar alguma empatia pelo que ele está passando? Não se trata de questionar se você ama o seu filho ou não. É bem óbvio que você ama o seu filho, independente do estilo de criação que você irá adotar. Mas é apenas quando você conhece e entende seu filho tão profundamente, que você será capaz de ter empatia por ele. Não tem jeito.
Você percebe que está sendo criado um vínculo de apego seguro, quando você percebe que conhece seu filho tão bem, tão profundamente. Você sabe que tipo de gemido ele faz quando está com fome, você sabe quando ele quer fazer cocô, você sabe quais são as brincadeiras preferidas dele, você sabe quais são os brinquedos favoritos dele, você sabe as coisas que assustam ele, você sabe quando ele está feliz. E talvez, a coisa mais mágica que pode existir quando há um vínculo forte: você sabe quando tem algo de errado com ele. Simplesmente sabe, mesmo sem saber explicar por quê, você simplesmente sente que há algo de errado.
Então, na fim do dia, pouco importa se você usa um sling de argola, ou um mei tai, ou um carrinho. Pouco importa se ele dorme na cama com você, ou se ele dorme em um berço perto de você. Se você olhar o contexto, como um todo, essas coisas não importam. É mais do que isso. É ouvir, entender e atender o choro. É estar em sintonia com o seu bebê e com as suas necessidades. É dar importância às suas necessidades, sejam elas físicas ou emocionais.
Além disso, mesmo que você use um sling para carregar seu bebê, isso não significa que o apego será automaticamente criado. Ou mesmo que você durma na mesma cama que o seu filho, não é garantia que você vá ter um vínculo de apego seguro. E sabe por que? Porque se você não está emocionalmente aberto para que o vínculo seja criado, não faz a mínima diferença.
Por isso que eu acho que não há razão na pergunta que eu fiz no início do post. E há menos razão ainda em se culpar ou se diminuir por não praticar absolutamente todos os princípios da criação com apego. Só que isso pode deixar uma dúvida:
– Então para que existem estes princípios, se eles não são tão importantes assim?
Bem, esses princípios são importantes, mas funcionam mais como ferramentas que auxiliam você a criar um vínculo forte com o seu bebê, sem se preocupar muito com a dinâmica do relacionamento e a teoria do apego em si. É difícil imaginar uma mãe que, por exemplo, tenha parido, amamente em livre demanda, durma próximo ao seu bebê, leve seu bebê junto ao seu corpo em um sling e pratique disciplina positiva, tenha dificuldades para criar e fortalecer um vínculo de apego com o seu bebê, não é verdade?
Tudo se resume a isso: conexão emocional.
15 comentários em “Quão Apegado Você É?”
Adorei o texto, acho que estou conseguindo criar uma conexão com a minha filha desde o nascimento dela, quando ela veio pro meu colo, eu conversei com ela, abracei, e ela parou de chorar me olhando como quem já me conhecia. A paixão foi instantânea, e só cresceu ainda mais de lá pra cá (já se vão quase 10 meses). É maravilhoso poder entendê-la porque eu me sinto participando dos acontecimentos da vida dela! E são tantas novidades todos os dias, que mesmo trabalhando, quando estou com ela, é como se estivesse entrando nesse universo particular que ela está descobrindo a cada dia mais e mais.
Lindo depoimento, Virgínia! Gratidão!
Vim parar aqui por conta do texto para esclarecer os pontos do apego da API e esse era tudo o q eu precisavs ler. Tô em crise desde do dia das mães e chorando muito de ontem para hoje justamente por conta de voltar ao trabalho daqui um mês.
Tava me sentindo a mãe mas insensível do mundo e ler esse texto me traz uma leveza na alma. Eu não me via com uma mãe que não é conectada ao seu filho, mas como ir trabalhar me parecia contra os checklist de boa mãe apegada, tava me sentindo muito mal.
Obrigada por ter inscrito.
Ô, Graziele! Um abraço virtual apertado!
Que bom que este meu texto lhe trouxe leveza, porque ele é muito sincero, sabe?
Um grande abraço!
Fico preocupada apenas com a questão q a mae e o pai precisa conhecer seu filho a fundo, saber todas as necessidades dele. Eu e minha filha temos uma relação linda, mas nunca soube dizer o que significava cada choro. Pelo menos não conscientemente. Continuamos falando de super mães e continuamos gerando culpa naquelas q não conseguem atender a esses requisitos. Cada dia aprendemos mais e mais sobre nossos filhos e cada dia eles aprendem sobre o mundo e se transformam. E ai precisamos aprender novamente sobre eles. É uma dinâmica rápida e, para dar conta, a mae ou o pai precisaria estar disponível 100% para seus filhos. E isso não é saudável. Descobrimos que não sabemos tudo sobre nosso filho qndo ele entra na escola, e recebemos o primeiro feedback da professora, por exemplo. Vamos viver a relação baseada no amor e nas relações saudáveis, com paz e tranquilidade, e com erros também, que faz parte e é são sim importantes para a constituição da personalidade dos nossos pequenos.
Gabriela, obrigado por vir aqui comentar.
A questão é que quando você desenvolve um vínculo de apego seguro com o seu filho, é quase inevitável que você conheça seu filho profundamente. Não se trata de saber exatamente o que cada choro quer dizer, mas de ser sensível ao choro. A diferença está em atender prontamente o bebê, mesmo que você ainda não saiba exatamente o que ele precisa. Será colo? Fralda? Fome? Sono? Você acaba descobrindo na tentativa e erro.
E perceba que o meu texto discursa justamente contra esse discurso enfadonho de super mães e culpa, trata-se de criar com apego sendo uma pessoa normal.
Muito bom esse texto, não faço cama compartilhada, quer dizer customizei a cama compartilhada, e vivo me perguntando se isso irá interferir na minha criação com apego. Mesmo tendo já tendo a resposta, que é perceber claramente que essa não é uma necessidade do meu BB, ele dorme feliz e tranquilo no bercinho dele, já a mãe…
Olá, estou visitando o seu blog pela primeira vez hoje. Confesso que ao ler o post “Criação com Apego: Aquele Resumo Que Você Sempre Quis” fiquei um tanto preocupada, justamente pq algumas coisas que constam nos princípios eu não considero essenciais. Agora que acabo de ler o ” Quão apegado vc é” me senti aliviada. Pq é isso msm que eu penso, na última frase vc diz simplesmente tudo com o termo “conexão emocional”. O importante é o amor e isso eu já sinto imensamente pela minha princesinha que ainda está no meu ventre. Quando ela mexe até penso ” será se ela está querendo me dizer algo?” pode parecer bobo, mas já aqui dentro acho que nós temos uma forte conexão emocional. O amor vai nos fazer disponibilizar tempo e afeto sem nem msm termos que programar isso, pois não se trata de uma regra, mas da espontaneidade que o sentimento nos permite ter. Gostei muito do seu blog, parabéns!
Olá, Bárbara. Obrigado por passar aqui e comentar! Que bom que você conseguiu já aliviar sua preocupação lendo um segundo texto meu, mas eu gostaria de pedir a sua ajuda para entender o que fez você ficar tão preocupada e o que você não considera essencial nos princípios? Talvez eu não tenha sido tão claro como eu gostaria no meu texto e não quero que outras pessoas confundam ou tenham a impressão errada. Vai que elas saem daqui com uma ideia errada sobre criação com apego, não é?
Um abraço!