Era um dia normal. Eu estava no trabalho e cheguei em casa no início da noite, mas nesse dia precisávamos ir ao mercado e comprar algumas coisas que estavam faltando em casa, principalmente frutas e outros alimentos. Normalmente, nós três vamos ao mercado e, enquanto um fica correndo atrás do Dante, o outro faz as compras. Só que, dessa vez, a Anne não tinha condições de ir por causa de uma virose e da gravidez. Sabe como é, a gravidez traz um cansaço de outro mundo para a gestante. Não sabia da novidade? Pois é, teremos outro bebê para alegrar nossas vidas! Eu contei essa novidade na fanpage do blog então, se você quiser, dá uma passadinha lá.
Anne estava muito indisposta para ir à rua conosco e não dava para adiar as compras, então fomos eu e Dante ao mercado que, na época, tinha 1 ano e 9 meses. E como a Anne não estava em seus melhores dias, também não conseguiu sair de casa com o Dante durante o dia. Eles costumam ir à pracinha, ou fazer algum outro passeio ao ar livre para ajudar o Dante a extravasar a energia dele. Mas nesse dia, ele ficou dentro de casa o dia inteiro, então era de se esperar que ele estava indócil para sair de casa.
Em um dia comum, o Dante já gosta de sair correndo por aí, principalmente dentro de mercados. Mas como havia sido um dia atípico para ele, fiquei um pouco apreensivo do que nos aguardava no mercado. Apreensivo com o risco de perder a paciência com ele em algum momento, depois de um dia cheio de trabalho. Sabe aquela história da fera interior? Bem por aí.
Chegando lá, estava cheio de esperanças de que ele fosse ficar sentado no carrinho de compras e, se tudo desse certo, tudo seria tranquilo e rápido. Agora, por que eu continuo me iludindo quanto a isso, eu não sei. Se você souber a resposta, coloque aí nos comentários, pois certamente ajudará muitos pais e mães iludidos que acompanham o blog!
Dante, de imediato, recusou o carrinho de compras. Ele sempre ficava boa parte sentado lá, mas dessa vez nem quis entrar. Queria andar no chão, ajudando a empurrar o carrinho. Tudo bem, essa combinação ainda poderia dar certo (e eu insistindo em me iludir). A lista era bem extensa: frutas, pastas, biscoitos, pães, sucos e coisas do tipo, mas quando se tem um bebê andarilho, que adora explorar e andar pelos corredores do mercado, é impossível pegar os itens da lista seguindo uma sequência lógica. Em situações como esta, eu tenho que me contentar em pegar os itens que estiverem ao alcance, no caminho que o Dante percorre.
Isso não era algo que eu realmente lamentei, porque já estava acostumado com essa dinâmica e esperando que fosse ser dessa maneira. Afinal, quem teve a brilhante ideia de levar um bebê ao mercado foi eu, não o próprio bebê.
Mas a coisa foi ficando mais complicada. Eventualmente, ele disparava a correr pelo mercado, então parava, começava a empilhar as caixas de saladas de frutas, corria de novo, empilhava caixas de sucos, corrias mais um tanto e continuava nesse processo. Foi só então que eu comecei a perceber todas aquelas pessoas do mercado que nos olhavam. Eram olhares que me julgavam. Comecei a sentir uma certa vergonha dos olhares, vergonha do que pensavam de mim, vergonha de que estivessem avaliando a minha performance enquanto pai. Julgando tratar de um pai que não impusesse limites, e que estaria criando um pequeno rebelde, uma criança problema. E quando você entra nessa espiral de sentir-se julgado como incompetente, fica difícil sair dela.
O sentimento de vergonha foi me consumindo, até que tentei pegar o Dante no colo para agilizar as compras, e mostrar àquelas pessoas que eu sou um pai que impõe limites e tem controle total sobre o próprio filho. Quem manda aqui sou eu! Dante berrou, protestou e chorou muito. Mas, ao invés de sentir-me ainda mais envergonhado, a sensação foi diferente. Aquele choro dele me trouxe de volta. Voltei a mim e olhei para o meu filho. Lembrei que o dia não havia sido fácil nem para ele, nem para a mãe dele. Lembrei que, de fato, aquela atividade estava sendo sua primeira atividade externa do dia, às 7:00 da noite. Lembrei que ele era apenas um bebê que foi levado a um mercado e estava se comportando como um… bebê.
O mercado era o divertimento dele naquele momento, então por que agarrá-lo no colo a qualquer custo, chorando, só para fazer as compras de qualquer jeito? Não fui eu quem decidiu levar um bebê, afinal? Se eu quisesse fazer compras em condições normais e tempo recorde, por que teria levado um bebê comigo, então?
Isso trouxe paz ao meu coração, e imagino que ao coração do Dante também. Nós dois percebemos que a tensão se dissipou entre nós e logo, logo, tudo estava mais tranquilo. Parecia até mágica, mas o clima ficou mais leve e ele começou a aceitar o meu colo em alguns momentos (momentos estes que eu usava sabiamente para correr com as compras), mas ele voltou a se divertir no mercado pegando as frutas e colocando-as no carrinho, roubando uvas do carrinho para comer, colocando pães dentro do saco de pães, empurrando o carrinho e, claro, correndo eventualmente pelos corredores do mercado.
A diferença era que, dessa vez, eu não me sentia mais afetado pelos olhares tortos das pessoas. Eu havia enxergado aquela situação com os olhos de quem mais me importava no momento: os olhos do meu filho.
Eu poderia facilmente ter me deixado levar pela frustração de não conseguir fazer as compras como faria normalmente. Levei pelo menos o dobro do tempo, mas a questão é que eu já não tinha essa expectativa mesmo. Acho que foi isso que nos ajudou, no final das contas: eu fui ao mercado com um bebê, sabendo que estava indo ao mercado com um bebê.
Por que transformar uma atividade com um bebê em algo extremamente desagradável, pelo simples fato de que ela precisa atender nossas expectativas e padrões do mundo adulto? Até que ponto isso vale a pena?
Uma ida ao mercado pode, afinal, ser divertida. É só uma questão de expectativa e empatia.
20 comentários em “Sobre Mercados e Bebês”
Há poucos dias eu descobri sua funpage, blog…tudo! E venho lendo sempre que posso!!! RS Descobri que criamos nossa filha com apego, sem saber que essa maneira realmente existia….
Sempre fomos no mercado nós 3, e é bem assim como você descreveu!!! Mas quando preciso ir só com ela, vou sem pressa, ir ao mercado é uma diversão para as crianças…
Uma vez estava eu e Alice (minha filhotinha que acabou de completar 3 aninhos) no shopping, ela tomando sorvete de casquinha, sozinha no carrinho, com 2 aninhos, e umas 5 pessoas em diferentes momentos vieram me “avisar” que ela estava se sujando, sujando a roupa, a mão, o rosto… Poxa ela é só uma criança! Tem que se sujar! E eu sorria… E falava, não tem problema, depois eu troco a roupa… Só 1 senhora veio e disse: ai que delícia, como é bom ser criança… Disse tudo! Ser criança!!!!!!!!! E quero muito que ela seja criança!
Obrigado pelo comentário, Aline! E que bacana essa senhora, hein? Isso é raro, hoje em dia!
"Chegando lá, estava cheio de esperanças de que ele fosse ficar sentado no carrinho de compras e, se tudo desse certo, tudo seria tranquilo e rápido. Agora, por que eu continuo me iludindo quanto a isso, eu não sei. Se você souber a resposta, coloque aí nos comentários, pois certamente ajudará muitos pais e mães iludidos que acompanham o blog!
Via Paizinho, Vírgula: https://paizinhovirgula.com/sobre-mercados-e-bebes/"
A resposta é "A ESPERANÇA É A ÚLTIMA QUE MORRE!!!" A vida é mais colorida com filhos justamente porque temos a possibilidade de resgatar nossa "criança interior"! O negócio é perceber isso, e PARABÉNS PRA VOCÊ!!! que já percebeu e está aprendendo a lidar com a coisa… bendita sua esposa que te tem ao lado dando esse suporte. E felicidades com o ovo integrante da família… Mercado com dois bebês rende um livro!!! 😉
Concordo plenamente. Não se pode esquecer que criança é criança e não esperar dela comportamento de adulto.
Eu também me iludo todos os dias, várias vezes por dia rsrsrs. Meu filho tem 1 ano e meio e quer fazer todas (todas mesmo) as atividades comigo. Talvez porque eu trabalhe fora e quando eu estou em casa ele queira compensar este tempo. Então, a cada atividade eu crio um cenário em minha mente: ele sentadinho no chão, brincando com seus inúmeros brinquedos e eu fazendo, coisas normais como escovar os dentes, trocar de roupa, comer, lavar a louça, etc. Mas não, realmente isso não acontece desta forma. Ele fica “grudado” em mim o tempo todo e cada vez que eu inicio uma tarefa sou interrompida por ele diversas vezes e nem sempre consigo terminá-la. Já cheguei a ficar ansiosa e irritada com isso. Mas por pouco tempo e devido às críticas que recebi de parentes e principalmente do esposo. Porque minha atenção principal, minha prioridade absoluta sem dúvida alguma é o meu filho. Quero dar todo o amor e a atenção que ele precisa e isso é um prazer pra mim. A casa e os afazeres continuarão sempre lá. Mas ele só vai ser criança uma vez e eu só terei uma chance de construir um vínculo verdadeiro e profundo com ele. Então, já desencanei de tentar fazer as coisas do meu jeito. Hoje minha rotina é adaptada ao Levi e não sinto nenhuma culpa ou arrependimento por isso. A casa está bagunçada, às vezes suja, eu não me maquio mais, lavo menos o cabelo, as refeições são em parcelas, o sono também porque ele ainda mama várias vezes à noite (a cama compartilhada facilita um pouco isso), abri mão de alguns programas, aderi a outros mais apropriados para ele e sei que quando ele crescer terei a imensa alegria de ver que criei um homem de verdade, um ser humano excelente, capaz de dar e receber amor, capaz de criar seus filhos como um verdadeiro pai, amoroso, presente, responsável. Minha missão é essa, por enquanto. E me sinto muito confiante de estar no caminho certo.
Um abraço!
Nossa! Que história! Parabéns por compartilhá-la.