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Uma Carta Para Você, Pessoa Estranha

"Essa é uma carta para você, que não resiste e sempre mexe com bebês lindos na rua. E, principalmente, bebês que estão acompanhados de irmãos mais velhos."

Olá, pessoa estranha, eu gostaria de falar com você. Eu lhe chamo de pessoa estranha, mas não no sentido de pessoa esquisita, tá? É apenas no sentido de que você é estranho a mim e, principalmente, aos meus filhos. Uma pessoa desconhecida.

Eu entendo como é difícil, às vezes, nos contermos com a belezura encantadora de bebês pequenos. Quase sempre acabamos mexendo com eles. Afinal, são tão fofos e adoráveis que não conseguimos controlar nossas mãos, né? Super entendo.

Tem vezes que a vontade de mexer nos bebês é tão grande, mas tão grande, que colocamos a mão neles, sem antes nos certificarmos de que a mãe, ou pai, daquele bebê está de acordo com essa demonstração de carinho. Na verdade, muitos pais e mães se incomodam bastante, porque sentem-se invadidos, caso você não saiba. Quem tem bebê possui, normalmente, um instinto de proteção muito forte dentro de si e uma pessoa estranha colocando a mão em seu bebê, inconscientemente, torna-se uma ameaça.

Por isso, é sempre bom tentar controlar seus impulsos de mexer em todos os bebês lindos, pelo menos até perceber se esse carinho é bem recebido pelos pais e pelo próprio bebê. Essa é uma dica valiosa!

Mas tudo bem, não é nem exatamente sobre isso que eu gostaria de falar com você. O que eu gostaria de conversar com você é sobre uma situação bem mais complexa: um bebê que está acompanhado de seu irmão mais velho. Sabe aquele bebê lindo e encantador? Então, é o mesmo bebê, mas ele agora está acompanhado de seu irmão mais velho, uma criança também linda e encantadora, mas que, talvez, para os seus olhos, não pareça tão fofa quanto o bebê.

Eu até entendo você, mas gostaria que você tentasse entender o mundo dessa criança mais velha, enxergando através dos olhos dela. Veja, essa criança já passa por um momento bastante difícil da vida dela, em que ela precisa aprender a lidar com um novo ser que, aos olhos dela, recebe todo amor e atenção do mundo. Essa criança não percebe que o irmão mais novo tem demandas muito urgentes e intensas. Essa criança não entende por que ela sente a falta de disponibilidade física e emocional dos pais e, com certeza, não percebe que seus pais estão tentando fazer o máximo para também atender suas demandas de criança mais velha.

Essa criança já sabe que as coisas são diferentes agora e, provavelmente, não sabe muito bem lidar com essa nova realidade. E aí entra você, uma pessoa estranha a essa criança, se aproximando do bebê, ignorando completamente a presença dela, elogiando a beleza encantadora de seu irmãozinho. Eu sei que você, às vezes, até se refere à criança mais velha, elogiando-a, mas só depois de ter falado milhares de coisas maravilhosas sobre o bebê. E, normalmente, os “elogios” que você faz estão relacionados a uma característica que, talvez, nem agrade tanto a criança assim:

— Olha só, virou irmão mais velho! Que responsabilidade!

— E aí? Tá gostando do irmãozinho? Você agora tem que ajudar a cuidar dele direitinho!

Agora, coloque-se no lugar dessa criança. O que você sentiria quanto a tudo isso? Consegue perceber o impacto que isso pode causar nessa criança? Aposto que você nunca pensou nisso, né? Tudo bem, é difícil entender os impactos de nossas ações em todo mundo.

Para essa criança, não só os pais adoram e “preferem” o irmão bebê, como todas as pessoas do mundo também a ignoram. Ela se sente invisível.

E se nós invertêssemos tudo, que tal? Imagine que, ao se aproximar desses irmãos, você primeiro se referisse ao irmão mais velho. Como uma cortesia respeitosa, você poderia falar com essa criança:

— Olá! Mas que criança mais linda, e que grande você é! Vejo que é tão grande, que tem até um irmão mais novo, um bebezinho. Seu irmão também é muito lindo, né?

Imagino que essa criança se sentiria muito mais feliz e incluída. Mais ainda: sentiria-se percebida e notada. Ser percebido é uma necessidade que todos nós temos, ainda mais uma criança pequena que está passando por um dos momentos mais desafiadores da sua vida.

O fato de você falar só depois com o bebê, além de fazer bem para o irmão mais velho, não fará diferença alguma para o bebê. Afinal de contas, é um bebê que não vai entender absolutamente nada do que você disser.

Então, querido estranho, eu gostaria de pedir um favor a você, de coração:

Enxergue o irmão mais velho.

Thiago Queiroz

Thiago Queiroz

Psicanalista, pai de quatro filhos, escritor, palestrante, educador parental, host dos podcasts Tricô e Pausa pra Sentir (dentre outros), autor dos livros "Queridos Adultos", "Abrace seu Filho", "A Armadura de Bertô" e "Cartinhas para meu pai", participou também do documentário internacional "Dads".

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Comentários

10 comentários em “Uma Carta Para Você, Pessoa Estranha”

  1. Carol Granato Weston

    Falou tudo, fico sentida em ver todos mexendo com a bebê e ele com aquele olhar comprido, me doi o coração
    !

  2. Danielle J L Brites

    Caraca! Passei por isso com meu filho do meio e o meu filho mais velho! O do meio nasceu exatamente 9 dias depois que o mais velho completou 2 anos. Como o mais velho ainda era pequeno, comprei um carrinho de gêmeos pra facilitar minha vida… Todo mundo que chegava perto e via que um era maiorzinho e o outro bebezinho, falava apenas com o bebê. Como aquilo me doía! A vontade que me dava era de dar um fora na pessoa e perguntar se ela era cega ou se não tinha coração… Hoje tenho uma bebê que completará 1 aninho dia 23/02 e os meus meninos já estão prestes a completar 12 e 10 anos. Como eles já estão maiores e mais independentes, dificilmente estão do meu lado quando alguém vem falar com a irmã. Como são bem mais velhos também, já entendem que ela é um bebê e precisa de um tipo de atenção diferente. Sempre conversei muito com eles e graças a Deus nunca rolou ciúmes… Mas temo que irei passar por essa situação do texto novamente pois ainda pretendo ter mais um filho e aí é a minha filha que sofrerá isso na pele! É muita insensibilidade dessas pessoas! Não sei o que se passa na cabeça delas.

  3. Andreza Passilongo

    Lindo apelo….. Quase chorei me sentindo o irmão mais velho… Parabéns pela sensibilidade dos seus textos, te admiro grandemente!

  4. Poliana Mendes Barbosa Duarte

    Meu Deus!!!! Vc disse tudo!!! Passo por isso constante com meu mais velho! Ele fica lá, tentando chamar a atenção, conversando e a pessoa estranha (que muitas vezes nem é estranha nada, é tio, avô, amigo da família) simplesmente IGNORA a criança enquanto se desmancha em elogios e falas infantilizadas com o bebê. Nossa, eu fico muito chateada! Em geral, eu chamo a atenção da pessoa pro meu mais velho, destacando algo legal que ele aprendeu ou fez. Quando não funciona, pego ele no colo e dou toda a atenção… Mas a vontade mesmo é mandar essa pessoa catar coquinho de preferência bem longe dos meus filhos!

  5. Crislaine Mayer

    Que Belo texto…. Eh tão mais fácil entender o que eles passam quando nós colocamos no lugar deles… Empatia ..

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